Carlos fico, indica três correntes que marcam a literatura sobre o
golpe de 1964. O primeiro, é o da ciência política. Nesta
corrente, destaca-se os trabalhos de: Alfred Stefan e Argelina
Cheibub Figueiredo.
Na sua tese, Stefan, irá defender a instituição militar como
sendo um subsistema que reage a mudanças no conjunto do sistema
político e o golpe, que ele chama de revolução, como derivado de
razões resultantes da inabilidade de João Goulart em reequilibrar a
política. Isto, nos possibilita uma pergunta: por que os militares
não tomaram o poder antes, quando derrubavam os presidentes? Stefan
nos responde que antes, os militares não estavam convencidos de que
tinham autoridade e legitimidade para isto e que também não se
sentiam ameaçados, por isto antes de 64 depunham o presidente e
passavam para outro grupo de civis, mas não assumiam o governo, ´e
o que o autor chama de relacionamento moderador. O autor Fico, nos
aponta algumas críticas e elogios ao trabalho de Stefan. Como
críticas, temos: a insuficiência no padrão moderador já que
existiu interferências diretas dos militares na política antes de
64; constrói um modelo explicativo com grande alcance de
generalização; é problemática a visão do sistema militar como
variável dependente da política global; superficialidade na análise
histórica da ideologia militar antes do golpe e afirma que o autor
não dá conta do problema da heterogeneidade política dos
militares. Como elogio, Fico diz que o trabalho de Stefan: aponta a
necessidade de se estudar os militares considerando as suas
interações com a sociedade e suas características de grupo;
demonstra que é possível pesquisar sobre o tema e divulga para os
historiadores o que animava os cientistas sociais e políticos.
Argelina, uma cientista política, em sua tese, recusa algumas teses
de caráter determinista, isto é, aquelas que afirmavam a
inevitabilidade do golpe. Assim, ela recusa a centralidade do papel
da burguesia na conspiração que é defendida no trabalho de
Dreifuss, já que a simples existência de uma conspiração não
seria suficiente para o golpe; diverge de Stefan, que afirma que no
final do governo Goulart, o presidente radicalizando sua posição,
acabou por erodir possíveis apoios. Assim, ela chama a atenção
para a necessidade de análise das escolhas anteriores que haviam
estreitado o leque de opções abertas à ação política. Seu
trabalho tem como virtude ser de alto nível e chamar a tenção para
episódios obscurecidos ou superficialmente tratados em outros
trabalhos.
Já a segunda, é a marxista. Aqui, destaca-se os trabalhos de:
Wanderley Guilherme dos Santos, Jacob Gorender, René Armand Dreifuss
e Daniel Aarão Reis Filho.
Em seu trabalho, Wanderley Santos, tem como motivação a
insuficiência no arcabouço convencional da análise do período
tendo como hipótese da causa do golpe as disputas dos grupos sociais
adversários na conquista de bens materiais. Enfim, a sua hipótese
central, é que a crise de 64 foi uma crise de paralisia decisória e
o golpe foi um resultado do emperramento do sistema político, isto
é, o golpe foi resultado da imobilidade do governo. Vale ressalvar,
que entre o trabalho de Santos e de Stefan, há um ponto de
discordância, que está no local de coalizões. Para Santos, a
coalizão era parlamentar, para Stefan era eleitoral. Enfim, para
Santos, o verdadeiro foco de disputa política estaria no padrão das
coalizões do congresso. Como virtudes, o seu trabalho: não constrói
um modelo generalizante, como os dos cientistas políticos; contém
um esforço teórico e rigoroso levantamento, sistematização e
análise de dados empiricamente; chama a atenção para o fenômeno
da rotatividade ministerial; busca demonstrar a “paralisia
decisória” de forma empírica e não como uma impressão; chama a
atenção para a importância das questões parlamentares, do
congresso, dos partidos políticos pois a literatura não costuma
considerar a dimensão política institucional das crises do período
no plano parlamentar e confirma que antes de 64 o sistema político
havia ficado operacionalmente comprometido. Como deficiência, Fico
aponta que a crítica ao paradigma tradicional é bastante confusa,
pois não se sabe se está criticando os marxistas ou os populistas,
e Argelina Figueiredo, diz que sua ênfase nos aspectos
político-institucionais o leva a subestimar o caráter
sócio-econômico dos problemas.
Gorender, no seu trabalho, faz um estudo da esquerda e da luta
armada. Ele afirma que o modelo de substituição de importações só
considera o aspecto superficial e deriva da idéia de que o processo
econômico se reduz a uma sucessão de modelos de política
econômica. Para Gorender, é ao contrário, a crise econômica de
62-65 foi a primeira crise cíclica nascida no processo interno do
capitalismo brasileiro e revelou o seu amadurecimento. Como virtudes,
o seu trabalho: se diferencia de outros autores ao indicar a
existência de riscos de efetiva vitória da esquerda antes de 64 e
consolida duas razões para o golpe: o papel do estágio do
capitalismo brasileiro e o caráter preventivo da ação da ameaça
da esquerda.
Em seu trabalho, Dreifuss pressupõe que o domínio econômico do
capital multinacional na economia brasileira não encontrava uma
correspondente liderança política. Assim, Dreifuss discorda de
Gorender. Para Gorender, o vetor da luta política estava na
substituição do controle de tipo populista das classes populares
por outro decididamente coercitivo. Já para Dreifuss, o vetor da
luta política estava na conquista da hegemonia pela fração
multinacional-associada da burguesia. Assim, acaba também
discordando de Stefan, que diz que os agentes do golpe foram as
forças armadas e não os empresários. Dreifuss, também chamará a
atenção para atuação de algumas associações que indicam ao
Bloco Multinacional Associado, a necessidade de um golpe de Estado
começando por uma campanha de desestabilização do governo pela
inquietação política. Enfim, sua hipótese é de que 64 não foi
um golpe das forças armadas contra Goulart, mas a culminância de um
movimento civil-militar para a plena realização dos interesses do
bloco multinacional-associado. Podemos perceber, que o que Dreifuss
faz, é uma leitura marxista clássica ao defender a existência de
um longo processo de luta política de um setor de classe pela
implementação de seus interesses. Para Daniel Reis, a fragilidade
do trabalho de Dreifuss está na superestimação da capacidade que
aquelas associações teriam de conduzir o processo histórico.
Por fim, temos o trabalho de Daniel Reis, que afirma o golpe de 64
como reforço da hegemonia do capital internacional do bloco de
poder. Ele tem a hipótese de que o golpe só foi possível pelo
caráter amplo e heterogêneo da frente social e política que se
reuniu para depor Goulart que conseguiu dar unidade às forças
armadas. Chama a atenção para o fato de que se a preparação do
golpe foi civil-militar, no golpe sobressaiu o papel dos militares.
E a terceira e última é a do papel dos militares. Destaca-se os
trabalhos de: Gláucio Soares e do CPDOC. Vale destacar que como
virtudes, o estudo da memória militar revela o caráter
aparentemente disperso da conspiração; indica a necessidade de se
diferenciar a atuação desestabilizadora da conspiração golpista
civil-militar já que a desestabilização civil foi articulada e a
ação militar ficou refém dos imprevistos; confirma a importância
do anticomunismo e com o mal-estar com a suposta quebra de
hierarquia e disciplina; confirma que o golpe decorreu de uma
conspiração desarticulada; esclarecem a pouca importância
atribuída pelos militares ao apoio militar norte-americano; revelam
a falta de uma liderança militar durante o período de conspiração
e a inexistência de um projeto de governo. No trabalho de Gláucio
Soares, ele vai defender o golpe como essencialmente político e
militar dizendo que ele não foi dado pela burguesia, independente do
apoio que estas deram aos militares, ou seja, o golpe não foi uma
conspiração dos grupos econômicos com o apoio dos militares, mas o
contrário. Soares irá criticar a interpretação marxista por
privilegiar as explicações econômicas e subestimar as demais e irá
discordar de Dreifuss que acha que os aspectos explicativos do golpe
estavam na articulação dos empresários em torno dos Ipes. Para
Soares, o importante é destacar as motivações dos militares para o
golpe, como: preocupação com o caos administrativo e a desordem
política; o perigo comunista e esquerdista e os ataques à
hierarquia e disciplinas militares.
O autor conclui seja quais for a causa ou causas d golpe, isto é, o
golpe como sendo resultante dos condicionantes estruturais ou dos
processos conjunturais ou ainda de episódios imediatos, que jamais
esta conjunção de fatores adversos se repita.
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