quinta-feira, 4 de dezembro de 2014

Biografia: Joana d'Arc

 Joana d'Arc nasceu em uma família de camponeses em torno de 1412 -é um dado impreciso pois naquela época não importava a idade exata, assim as pessoas se baseiam no seu interrogatório em 24 de Fevereiro de 1431, onde ela teria dito que na época tinha 19 anos - na cidade de Domrémy, na região de Lorena na França. Filha de Jacques d'Arc e Isabelle Romée, tinha mais quatro irmãos, sendo ela a mais nova de todos. O seu pai era agricultor e a sua mãe ensinou-lhe todos os afazeres de uma menina da época, como fiar e costurar. Joana também era muito religiosa e começou a ter visões espirituais ainda em sua adolescência. Foi em 1425 que teve visões de São Miguel, Santa Catarina e Santa Margarida, que lhes disse para expulsar os ingleses e trazer o rei Carlos VII para sua coroação. É difícil dissociar a Guerra dos Cem Anos da história de Joana d'Arc, por isto farei uma breve contextualização desta.
Desde que Guilherme se apoderou da Inglaterra, em 1066, os monarcas ingleses começam a controlar extensas terras no território francês. Com o tempo, passam a controlar várias partes do território francês, como Aquitânia, Gasconha, Poitou, Normandia etc. Quando a França tentou recuperá-los, deu origem a Guerra dos Cem Anos. O início da guerra ocorreu em 1337 pela disputa dinástica. Como Eduardo III, possuia alguns territórios na França, achou-se no direito de reclamar a coroa para ele, já que o rei francês Carlos IV morreu em 1328 e, ele não tinha herdeiros. Havia ainda a Lei Sálica, segundo a qual o trono não poderia ser ocupado por um sucessor vindo de linhagem materna. Porém, a assembléia francesa, optou por um candidato nacional, o seu primo por parte materna, Filipe de Valois, que fora aclamado e proclamado Filipe VI, o rei da França. Eduardo III, recusou-se a reconhecê-lo como rei, e assim também se proclamou como rei da França. E a batalha continuará.
Em 1422, com a morte de Carlos VI, os borguinhões coroam Henrique VI da Inglaterra como rei francês, mas as pessoas de Orleães (armagnacs) não desistiram e mantiveram-se fiéis ao filho do rei, Carlos VII, coroando-o também em 1422 como o seu rei. Em 1428, Joana começará a mudar a história da guerra. Ela estava convencida de que tinha um chamado especial de Deus para salvar a França da ocupação do Exército Inglês, e por isso foi a Vaucouleurs pedir ao comandante da guarnição, o conde Robert de Baudricourt, para mandá-la para a corte real francesa em Chinon, onde estava o herdeiro da coroa francesa. No ano de 1429, Baudricourt aceitou enviá-la junto a uma escolta até ao herdeiro. Chegando a Chinon, Joana já dispunha de uma certa popularidade, porém Carlos VII tinha ainda desconfianças sobre a moça. Decidiram passá-la por algumas provas e as autoridades eclesiásticas submeteram-na a um interrogatório averiguando suas intenções. Convencido do discurso de Joana, o rei entrega-lhe uma espada, um estandarte e o comando das tropas francesas, para seguir rumo à libertação da cidade de Orleães, que havia sido invadida e tomada pelos ingleses há oito meses. Munida de uma bandeira branca, ela chega a Orleães em 29 de Abril de 1429. Comandando um exército de 4000 homens ela consegue a vitória sobre os invasores no dia 9 de Maio de 1429. Está é uma das versões, porém existe uma outra que diz que ela teria chegado para a batalha num cavalo branco, com armadura de aço, e segurando um estandarte com a cruz de Cristo, circunscrita com o nome de Jesus e Maria. Nesta segundo versão, Joana teria sido apenas arrastada pelo fascínio dos seus sonhos e disposta a cumprir a missão segundo a vontade divina e sem saber nada sobre a arte da guerra comandou os soldados de forma que todos a respeitavam por ser extremamente disciplinada. Após a libertação de Orleães, os ingleses pensaram que os franceses iriam tentar reconquistar Paris ou a Normandia, e ao invés disto, ela convenceu Carlos VII a iniciar uma campanha sobre o rio Loire. Isso já era uma estratégia de Joana para conduzi-lo a Rouen.
Em 1430, Joana d'Arc passou a tentar libertar a cidade de Compiègne, onde acabou sendo dominada e capturada pelos borguinhões, aliados dos ingleses, em 1430. O processo contra ela teve início no dia 9 de Janeiro de 1431, sendo chefiado pelo bispo de Beauvais, Pierre Cauchon. Durante todo o tempo, ela usava roupas masculinas e tinha uma armadura feita especialmente para ela. No dia 21 de fevereiro Joana foi ouvida pela primeira vez e interrogada sobre as vozes que ouvia, sobre a igreja militante, e sobre seus trajes masculinos. No dia 27 e 28 de Março, Thomas de Courcelles fez a leitura dos 70 artigos da acusação de Joana, e que depois foram resumidos em 12. Os 12 Artigos1, lidos em público no dia 23 de maio, consistiam basicamente em:
1º - As aparições que Joana d'Arc via desde os 13 anos eram ligadas ao demônio.
2º - Os sinais dados ao rei, para comprovar que ela era mesmo uma enviada de Deus, eram mentiras que denegriam a Igreja.
3º - Não era possível reconhecer os anjos nas vozes que ela descreveu ouvir e seguir seus conselhos foi um erro de fé.
4º – Fez uso de adivinhação e superstição para saber dos acontecimentos.
5º - Ao usar roupas masculinas blasfemava contra Deus e transgrediu a fé cometendo assim idolatria.
6º - Foi blasfemadora ao colocar os homens em conflito em nome de Deus.
7º - Transgrediu os mandamentos de Deus no momento que não honrou o dever com seus pais (fugiu de casa para concluir sua missão).
8º – Ao saltar da Torre de Beaurevoir desrespeitou à fé e portanto cometeu um pecado mortal.
9º – É contraditória quando argumenta que guardou sua virgindade para garantir sua ascensão ao céu, cometendo assim um pecado contra a fé cristã.
10º - Ao dizer que os santos estavam contra a Inglaterra para estar ao lado dos franceses blasfemou contra eles.
11º- Usou-se de idolatria e invocação para manter contato com as vozes, o que era um outro erro na fé.
12º - O pecado de não reconhecer o poder designado por Deus à Igreja Militante.

Os ingleses não podiam somente condená-la e matá-la. Tudo indica que eles não queriam que ela se tornasse uma heroína para o povo e que conseguisse concluir a sua missão de coroar Carlos VII, por isso, passam ela por um processo inquisitorial para tentar deslegitimar suas ações para que pudessem atingir a autoridade do rei, pois, se comprovassem que ela não era orientada por Deus como se dizia, Carlos VII também não poderia se auxiliar nela para se legitimar política e religiosamente. Enfim, como Macedo (MACEDO p. 87-8 apud CERINI p. 66) afirma, o processo teve um duplo sentido, sendo um de caráter religioso e o outro de caráter político. Foi de caráter religioso, porque procurou examinar os fundamentos da fé de Joana, acusada de heresia e de bruxaria e, fora político, porque a condenação ou a absolvição influenciaria no resultado do conflito entre a Inglaterra e a França. Se ela fosse considerada culpada, Carlos VII poderia ser acusado de ter sido auxiliado pelos poderes maléficos da magia negra e, nenhum rei cristão poderia ter sua soberania pautada em ações heréticas. Em outras palavras, toda a ação de Joana para coroá-lo teria sido em vão, e sua posição como rei seria ilegítima.
No dia 5 de abril os artigos, anteriormente citados, sustentavam a acusação formal para Joana procurando a sua condenação. Joana é executada como herege, em Rouen, em 1431. Ela entrou, vestida de branco e após lerem o seu veredito, Joana foi queimada viva. As suas cinzas foram atiradas ao rio Sena, para que não se tornassem objeto de veneração pública.
A revisão do seu processo, a pedido da família, começou a partir de 1456, quando foi considerada inocente pelo Papa Calisto III, e o processo que à condenou foi considerado inválido. No ano de 1909 a Igreja Católica autoriza a sua beatificação e em 1920, Joana é canonizada pelo Papa Bento XV. Joana d´Arc desta maneira teve a sua honra reabilitada, e os nomes de feiticeira e bruxa foram apagados de sua biografia para que ela fosse reconhecida pelas suas virtudes heróicas, provenientes de uma missão divina. Joana como um mito2 só tem crescido com o passar dos anos. Enfim, a imagem de Joana d'Arc vai se transformando ao longo da história, sendo considerada hoje uma heroína nacional da França.



2 Mito, segundo o conceito de Campbell, é o que dá forma ao mundo e atribui sentido a ele. É uma tentativa da humanidade de compreender a razão e o propósito da existência, da experiência humana. Campbell, ainda explica que o mito tem quatro funções básicas: a metafísica, a cosmológica, a sociológica e a pedagógica. Sua função metafísica serve para nos despertar para o mistério, o desconhecido; sua função cosmológica serve para descrever o universo, o nosso mundo como um todo, de modo que tudo nele contido tenham sentido e significado para nós; sua função sociológica serve para estabelecer “a lei”, os códigos morais e éticos para as pessoas daquela cultura seguirem, enfim, serve para legitimar a ordem social. Sua função pedagógica serve para nos conduzir às varias etapas da nossa vida, do nascimento à morte.

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