Faz-se necessário pensar sobre a
utilização de imagens e cinema na sala de aula. Está, é uma
discussão bastante interessante, pois normalmente se faz uso delas
sem pensar numa didatização e educação dos docentes. Fomos
criados numa cultura onde, a todo momento, somos bombardeados por
imagens, e tais imagens, nos informam e nos formam, de maneira
desapercebida. Assim, o movimento de reflexão que se propõe, é
pensar nessa desnaturalização da imagem, e começarmos a perceber o
seu conteúdo formativo. Para isto, convocarei as reflexões de dois
autores: Ana Mauad e Wenceslao Machado.
Qual a relação entre história
e fotografia? Será a história puramente a duração e a fotografia
seu registro? Para responder a tais questões, em primeiro
lugar, devemos tomar a fotografia como sendo uma agente da história,
pois de acordo com Mauad, a fotografia não é só fonte de
informação sobre o passado, mas “um meio, uma forma da
expressão visual resultante de uma prática social que agência
processos e produz sentidos, num movimento constante de
deslocamentos por dentre outras imagens”. Ou seja, a
fotografia também é determinante da formulação dos sentidos da
história por ser um dispositivo que nos permite conhecer o mundo
social por ser o meio pelo qual
o fotógrafo inscreve sentido histórico ao mundo visível,
ordenando-o com base na sua atribuição política.. Devemos
assim, segundo a autora, discutir a noção de foto-ícone, fotos
canônicas (aquelas fotografias que ganham expressões públicas e
são apresentadas como uma síntese real do acontecimento), e
ultrapassar a idéia reducionista de uma história por detrás da
foto, começando a pensar na questão mais tangente de que é a foto
que faz história. A autora chama mais a nossa atenção para a
questão da foto tomada como ícone, que tomada como uma
sintetizadora semelhante do que aconteceu, tornam tal acontecimento
presente, e sugere que o que está ali, é o acontecimento tal como
ocorreu. Assim, para ela, não é válido sugerir uma verdade por
trás da foto, e devemos pensá-la como uma representação, como uma
versão do vivido.
Cabe-nos aqui outra pergunta: a fotografia é mesmo uma
representação do real? As
imagens são históricas e dependem de variáveis técnicas e
estéticas do contexto histórico que as produziram e das diferentes
visões de mundo. Nesse sentido, as fotografias guardam a marca do
passado que as produziu e consumiu. Mauad nos diz que por
muito tempo esta marca inseparável de realidade foi atribuída à
imagem fotográfica, mas devemos considerar que entre o sujeito que
olha e a imagem que elabora há muito mais que os olhos podem ver. Em
outras palavras, de acordo com a autora, a fotografia não é o
real, mas uma
elaboração do vivido, o resultado de um ato de investimento de
sentido, ou ainda uma leitura do real realizada mediante o recurso a
uma série de regras que envolvem, inclusive, o controle de um
determinado saber de ordem técnica. E
Mauad cita Arnhein, que nos incita na desnaturalização da
representação fotográfica, estabelecendo uma comparação entre a
imagem fotográfica e o objeto concreto. De acordo com o seu
pensamento, a fotografia é bidimensional, plana, com cores que em
nada reproduzem a realidade, isola um determinado ponto no tempo e no
espaço, acarretando a perda da dimensão processual do tempo
vivido, é puramente visual, excluindo outras formas sensoriais, tais
como o olfato e o tato. Portanto, a imagem fotográfica não guarda
nenhuma característica própria à realidade das coisas. Contudo,
não importa se a imagem mente; o importante é saber porque mentiu e
como mentiu, assim, teremos bons e estimulantes trabalhos
investigativos.
Também devemos considerar as relações entre a trajetória
profissional do fotografo, sua prática fotográfica e a construção
do fato histórico, lembrando que a fotografia nunca é neutra,
sempre tem uma intencionalidade, sempre tem um olhar por detrás das
câmeras. Enfim, quando vemos uma fotografia, deveríamos pensar nos
processos de produção de sentido que nela está embutida, porque,
segundo Mauad, uma fotografia adquire valor histórico,
pela sua capacidade de responder as demandas visuais do circuito
social (produção, circulação, consumo e agenciamento) organizados
por diferentes instâncias da cena pública (imprensa, mercado,
estado, movimento social etc.), como pelos recursos técnicos e
estéticos utilizados para esse trabalho.
Mauad, nos aconselha alguns passos para compreendermos o sentido da
fotografia. Assim, de acordo com ela, o nosso ponto de partida seria
compreender a natureza técnica do ato fotográfico, o seu caráter
de indício sendo considerada como testemunho por atestar a
existência de uma realidade. O segundo passo seria compreender que
entre o objeto e a sua representação fotográfica interpõe-se uma
série de ações convencionalizadas, tanto cultural como
historicamente. E por fim, deveríamos considerar a fotografia como
uma determinada escolha realizada num conjunto de escolhas possíveis
dentro da visão de mundo do fotográfo.
Devemos também parar de associar a fotografia como sendo um
documento-verdade, e começarmos a assumi-la como sendo uma
imagem-conhecimento. Ou seja, a fotografia, tem muito a nos dizer,
pois ela é monumento e documento/ conhecimento, por se tratar de uma
fonte que retratou um tempo, um momento remoto, e que portanto é
testemunha deste, e como um monumento, pois foi uma escolha de grupos
sociais por manter aquele momento para ser rememorado num outro tempo
e conforma assim uma determinada visão de mundo. Contudo, a autora
nos diz, que como qualquer documento, deveremos saber fazer
perguntas, pois a imagem não nos falará nada caso não saibamos
interrogá-la. Esta sua fala, me remeteu ao pensamento de Marc Bloch,
no seu livro A escrita da história, em que tal autor chama as fontes
de testemunhas e nos diz que devemos interrogá-las. E Mauad também
nos chama a atenção para a questão da escrita, pois sem a marca da
palavra enunciada, a fotografia vagaria pelas tramas dos fragmentos
de lembranças, esquecimentos, silenciamentos. Assim, cabe a nós,
quando trabalharmos com imagens querendo saber de um tempo, casarmos
várias fontes, para assim, podermos nos aproximar de um tempo que
nos é desconhecido.
Vale ressaltar, que como qualquer fonte a ser lida e interpretada, a
imagem requer uma relação entre o que o fotografo e a sua imagem
informam ao visualizador. A leitura de uma imagem, requer uma série
de conhecimentos prévios e compartilhados e algumas competências de
quem olha, pois só assim, ele poderá fornecer significados à
imagem. O fotografo, também tem que deixar clara as suas intenções,
pois a partir do momento que produz uma fotografia, ela não pode ser
lida somente por ele, mas pelo público, pelo coletivo. Enfim, caberá
a percepção e interpretação do indivíduo que depende de um
processo maior, que é o da educação do olhar. Ou seja, a partir
dessa educação do olhar, as pessoas tem competências maiores para
entender a proposta conjunta do artista, desde a sua forma de
expressão, que tem haver com técnicas e estéticas, tais como
enquadramento, iluminação, definição da imagem, contraste, cor
etc, e, conteúdo que é determinado pelo conjunto de pessoas,
objetos, lugares e vivências que compõem a fotografia.
E o filme, o que temos que pensarmos quando é usado na sala de
aula? Os filmes, são muito interessantes de se discutir, pois
geralmente, são usados sem nenhuma intenção pedagógica e
utilizados em momentos de falta de professor, ou para passar o tempo.
Tendo em vista esta proposta, vale a pena levantar algumas questões
de Wenceslao sobre filmes.
Primeiro, devemos lembrar que o filme é sempre uma representação,
e nunca a realidade, e que como produção, é idealizado por muitas
pessoas diferentes, que nem sempre quem escreveu é quem produziu, ou
quem dirigiu. Devemos também parar de tentar descobrir o que o autor
quis nos dizer com o filme, e começar a refletir acerca daquilo que
o filme nos disse. Wenceslao nos chama a atenção de que as imagens
do filme têm a mesma materialidade das imagens dos sonhos que são
reais enquanto imagens, e que tais imagens, nos remetem ou se
conjugam com outras imagens já presentes em nós. Assim, uma imagem
é singular, mas também é representativa de um todo. A imagem, por
exemplo, de um porco, será como um conceito, como a palavra porco
escrita em um livro, que pode estar se referindo a qualquer tipo,
idade, naturalidade, deste animal.
Wenceslao também ressalva que os filmes são produções para serem
vendidas e consumidas, e que acabam gerando ideologias invisíveis,
principalmente nas crianças, como por exemplo, noções de gênero e
sexualidade, de família, de infância, de uma determinada camada
dominante da sociedade, inculcando assim, lógicas e hábitos
sociais. O autor também ressalva que o Cinema para os americanos em
geral é uma forma de entretenimento, de diversão, e não uma forma
de conhecimento ou arte, mas que ensina valores e atitudes. Enfim, é
uma indústria com fins lucrativos claros e que segue uma determinada
segmentação do mercado.
Por fim, vale ressalvar a questão da sonorização, algo tão
natural para nós. Podemos perceber, que os personagens tem tons
narrativos diferentes que nos remetem a características de cada
personagem,por exemplo alguns tem um tom calmo, que é o herói, o
mocinho, outros tem um tom mais agressivo, intimidativo, como o
vilão. As músicas embaladoras dos personagens também tem muito a
nos dizer. Em cenas por exemplo de aflição, de tensão e morte, é
uma música mais dramática e geralmente instrumental. Enfim, tal
sonoplastia, tem o poder de direcionar sentimentos e expectativas nos
que ouvem. Para concluir, vale destaca, segundo o autor, que com o
final do filme, iremos buscar relações e âncoras em lembranças e
projetos e cenas cotidianas, e que quando o filme termina, ele não
acaba, deixará de existir somente como produto audiovisual e se
tornará, digamos, imaginário e imaginante.
De acordo com o pensamento de tais autores, é válido concluir que
trabalhar com imagens, é um desafio que o historiados terá que
enfrentar. Não será fácil, e ele terá que sair de sua zona de
conforto para educar criticamente o docente. É possível concluir
também que temos de tomar cuidado em tornar
equivalente a imagem e a realidade (a verdade do real e não como a
verdade da imagem) pois segundo Wenceslao, a fotografia
é uma obra imagética que diz de como o espaço geográfico é
pensado e utilizado pelo grupo social que produziu aquela obra.
Assim, quando fazemos uso da linguagem fotográfica, buscando a
sensação de realidade dada pela visualidade fotográfica, ganhará
forca o pensamento de que a realidade espacial daquele lugar seja
aquilo que está na foto. Enfim, é algo desafiador e complexo, que
caberá a quem for trabalhar, desconstruir e desestruturar estas
fontes, para que possamos entendê-las como uma representação
documento e monumental de um certo tempo, cabendo ao profissional,
usar de determinadas técnicas e formas para construir o pensamento
histórico.
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