O governo de
Castello Branco manteve-se fiel ao ideal sobornista: promover, via
integração institucional, o modelo de civilização realizado pelos
países centrais do sistema capitalista. Assim, também, na área
política. Para corrigir as distorções que marginalizavam os
udenistas e seus aliados, o governo começou com uma série de
reformas.
Uma das mais
importantes, a da administração pública, visava racionalizar a
organização e os métodos de trabalho da máquina burocrática de
modo a capacitá-la para desempenhar funções no quadro do
capitalismo maduro. No plano político-partidário, tal reforma tal
reforma tenderia a destruir as fontes de alimentação das práticas
clientelistas que bloqueavam a alternância no poder.
Outra grande
iniciativa foi a proposta da reforma agrária, que tratava-se de
eliminar os proprietários incapazes de modernizar seus
estabelecimentos, ao mesmo tempo em que seria gerada, por meio de
apoio governamental , uma nova pequena-burguesia rural, autônoma e
competitiva, a coexistir com as médias e grandes unidades
capitalistas. Providências desse tipo, testemunhavam a disposição
de restabelecer um regime reformado de cunho liberal-democrático.
Os autores também
vão destacar o conflito entre os castelistas e duros e sua
permanente disputa pela definição do rumo a ser imprimido ao
processo político. No plano político, o governo de Castello aparece
como um suceder de derrotas. Não queria a cassação de JK, mas foi
obrigado a realizá-la; opunha-se a prorrogação de seu mandato, mas
acabou por aceitá-la; convocou as eleições de outubro de 65 contra
as resistências da oficialidade dura, mas logo a seguir, editou o
AI-2 para apaziguá-la; queria um nome identificado com o seu ideário
para substituí-lo na presidência, mas assistiu impotente ao
crescimento da candidatura de seu ministro da guerra.
O AI-5 em 1968
O período que
começava com Costa e Silva, caracterizava-se como o que os autores
chamam de abertura política. Ao mesmo tempo, o slogan da humanização
coloria as diretrizes da ação governamental. Para explicar o que
iria se passar é preciso levar em conta além das frustrações
continuadas as esperanças despertadas e autoconfiança ressurgida.
Daí vinha o ânimo que organiza a Frente Ampla. Três dias após a
posse do novo presidente, Lacerda reconhecia que as diretrizes
traçadas pelos ministros do Planejamento e do Interior eram de fato
as mais apropriadas para o país. Logo depois, JK diria a mesma
coisa.
Lacerda que
mobilizara a direita para impor a sua candidatura contra a vontade de
Castello Branco, iria agora mobilizar a esquerda para disputar com a
direita sucessão de Costa e Silva. Embora os emedebistas temessem a
reação militar que as atividades da Frente poderiam suscitar, a
opção oficial do partido foi a de não se indispor com os
parlamentares frentistas e com as parcelas radicalizadas da opinião
pública. A existência e o desenvolvimento da Frente contribuíram
para aguçar a combatividade do movimento estudantil que já optara
pelos métodos não-convencionais de luta política. Mas o estopim
foi a morte do estudante Edson Luís num choque entre a polícia e
estudantes que simplesmente reivindicavam a melhoria de um
restaurante. A partir daí, deflagra-se a crise que irá culminar com
a edição do AI-5.
Comparando os
governos Médici e Geisel
Surgido em 69 como
solução intermediária para a crise militar , já em meados do ano
seguinte, o governo Medici havia vencido as últimas resistências
internas, havia acimentado as suas bases de apoio e começava a
colher os dividendos políticos dos repetidos sucessos que passaram a
se acumular.
A economia
brasileira segue em sua inflexão ascendente. De 70-73, a propaganda
do governo bombardeava a população com a mística do “Brasil
Grande”, com as evidências dos progressos alcançados e o apelo
agressivo dos projetos-impacto, procurando explorar ao máximo o
efeito ideológico das políticas sociais. Um país forte, dinâmico,
seguro, em paz consigo mesmo.
A situação
vigente , em que a ordem institucional sobrepunha-se à ordem
constitucional numa convivência precária e embaraçosa, era uma
situação menos do que satisfatória. Por um lado, ela contaminava o
processo político com um grau pouco tranquilizador de
imprevisibilidade; por outro, deixava pendente uma série de
problemas, dentre os quais o da sucessão era o mais angustiante.
A questão do
modelo político violento comparece como um dos pontos permanentes na
agenda do debate público. Recebendo estímulos que provinham dos
setores liberais da vida nacional, da igreja, da grande imprensa, da
judicatura, da intelectualidade, Medici solicita a atenção dos
políticos e chega a alcançar os círculos militares.
Já na atuação
política do governo Geisel, está a máxima prudência, o
gradualismo que caracterizou o seu projeto. O contraste com o intento
de Castello de assegurar a normalidade política pela outorga de uma
nova constituição não poderia ser mais gritante. Com Geisel, as
regras formais, as disposições escritas perdem muito de sua aura;
na sua gestão, todo privilégio é concedido às normas
efetivamente operativas no comportamento político dos atores, que
devem aprender a se movimentar num campo onde predomina o tácito, o
subentendido. De outra parte, à diferença do que se fez no passado,
agora não se estipulam metas, nenhum compromisso é estabelecido.
Prazos não são definidos. Não se pensa num retorno ao estado de
coisas do passado, não se acena com a perspectiva de anistia,
eleições diretas, alternância de poder ou qualquer outro item que
pudesse indicar a democracia como alvo.
A normalização
que se pretendia é o da ordem revolucionária. Mais do que um
programa de transição, o que se esboça era um projeto de
institucionalização do regime autoritário, que prevê medidas
liberalizantes, mas apenas na medida em que sirvam a esse propósito.
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